segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Texto Integral de "Amada Luísa"

Amada Luísa,
Escrevo-lhe sob a sombra fresca de uma árvore, diante de várias outras. Creio que sejam orvalhos, mas não posso afirmar com certeza. É lindo esse lugar, apesar de tudo. A terra segue escura por todo o terreno, coberto sempre de vasta vegetação, árvores gigantes e cobertas de folhas, o que faz os piores dias de calor parecerem um resquício do ódio aqui presente.
É outono, tenho certeza, pois, diferentemente de nosso país, nessa época do ano todas as folhas daqui, em todos os ramos, sem exceção alguma, começam a secar, avermelhar-se e cair. É algo lindo de ver. Espero que, quando voltar desse inferno e a paz reinar nesses campos, possamos juntos visita-los.
A verdade é que não quero lhe dar falsas esperanças, amada, mas como posso, se eu mesmo acredito que logo estarei de volta? Acredita quando digo que vejo nas lindas folhas do outono caindo, uma a uma, o tique-taque de uma contagem regressiva? Tenho certeza que sim. Espero ansiosamente que, quando puder ver a terra vermelha e seca, saberei que é hora de sair dessa tortura e retornar aos seus braços carinhosos. Ah, como sinto falta de sua pele!
O outono aqui deixa marcas nas árvores. Elas estão envelhecidas, cansadas, mas resistem persistentes à estação. Poderia exprimir assim minha situação. Faz algum tempo que me encontro longe de ti, mas sinto que séculos passaram e eu continuo esperando pela volta. Começo a ver rugas em mim. Ontem, achei um fio de cabelo branco dentre os outros, tão distintivamente negros. A distância entre nós não faz bem para meu físico e mente.
Porém, embora sinta meu corpo velho e cansado, meu amor por ti continua jovem, cheio de vigor. Todo o dia sei que a amo mais e mais. Essa crescente intensidade amorosa não me permite concentrar-me no aqui e agora, justamente o que mais preciso para voltar para seus braços. Pode imaginar o que sinto ao ver-me preso aqui, nesse inferno sem fim, pensando sempre em você? É uma tortura agonizante, maior do que qualquer uma cuja execução já foi realizada nos soldados que lutaram ao meu lado.
Pelo menos, tenho o conforto das memórias, que me tranqüilizam quando muitos estão aflitos e sozinhos. Sei que está a me esperar e, sempre que desanimo, o que acontece com certa freqüência, lembro de nossas noites juntos.
Há, porém, uma em especial, que cura qualquer dor que eu sinta. Lembra-te? Nós dois, juntos no leito, trocando carícias e beijos, demonstrando carinhosamente nosso afeto. Falamos de amor, paixão, desejo e conforto. Tocamos um ao outro a pele. Tomei algumas mechas suas com minha mão e as enrolei pelos meus dedos. Lembro-me de sua voz, doce, dizendo que me amava e a minha, embevecida, respondendo o mesmo. Enchemo-nos de júbilo e nosso corpo mergulhou na paixão. O quarto parecia desmanchar lentamente, deixando apenas nós dois e o leito, que também começava a apagar de minha visão. Meus olhos eram seus apenas. Por fim, não via nem a mim mesmo, mas seu corpo delgado e amado, pelo qual tenho tanto apreço. Aquela noite acabou com nossa fome saciada. O ar era úmido. Suava por todo corpo, compartilhava as gotas contigo. Beijamo-nos e dormimos, como se nada mais importasse.
Sei hoje que nada mais o faz. Aquele dia me marcou de tal forma que não consigo mais atirar sem antes recorda-lo. A única coisa que me mantém vivo nesse campo de ódio são as lembranças e expectativas de amor. Enquanto tantos morrem aqui, eu renasço ao ver nós dois novamente no leito, amando-nos. Posso eu dizer quanto sou grato por ter essa memória em minha mente?
Mas não me contenho com recordações apenas. Enquanto na minha mente vejo nós dois encobertos pelo amor, no campo de batalha vejo sangue, morte. Muitos já falaram e escreveram sobre a arte da guerra, mas eu não vejo sentindo nessa expressão. Nosso amor é uma arte. Essas árvores envelhecidas, com suas folhas vermelhas e secas, também são uma arte. Nossa noite juntos foi uma arte. Mas não vejo, de forma alguma, arte na guerra. De fato, pelo contrário, vejo a destruição dela no meio do combate.
Tudo que quero é sair daqui. Ter-me novamente contigo. Sinto saudades de ti, de nossos amigos, nossa cidade, nosso país. É tão frio nesse lugar. Estou cercado de pessoas, mas me sinto só. Todo dia é um novo medo. Tenho que acordar cedo, fazer vigília e marchar, receando uma bomba repentina. De quando em quando há uma invasão, uma armadilha, mas sempre sobrevivo. Será que terei a mesma sorte até o final da guerra? Não desejo morrer. Muitos aqui o querem, mas não eu. Meu sonho é voltar para o lugar de onde saí, de onde nunca deveria ter partido. Enganam aqueles que falam sobre a obrigação com a pátria, a honra de servir o país. Deveria saber eu de todas essas mentiras. Para que servir a pátria por um meio injusto, desumano e cruel?
Acordo pensando em ti, durmo pensando em ti. Se morrer aqui, saiba, portanto, que foi pensando em ti.
De seu eterno apaixonado:
Daniel

A volta dos estudantes

Não há arte maior do que um grupo reunido por uma causa em comum.
Os estudantes sempre fizeram parte da política no Brasil. Desde antes da metade do século passado, esse grupo já se organizava em manifestações a favor ou contra uma atitude ou proposta do governo. Mesmo durante a ditadura, repressiva e violenta, os jovens iam às ruas protestar e reinvindicar.
Não faz muito tempo que a UNE era a melhor representante dos estudantes. Ela gritou contra o governo militar, a favor das "diretas já", contra o Collor e a favor do impeachment do mesmo.
Não podemos, porém, mais contar com essa organização atualmente. A UNE hoje se mostra totalmente partidária, vendida e omissa em relação a todos os escândalos do governo vigente. Nem ao menos participou do movimento "Fora Sarney", criado e desenvolvido no meio estudantil.
O cúmulo, porém, deu-se há poucos dias, quando nenhum líder da organização mostrou-se realmente preocupado em relação ao ENEM. No início desse ano, sem diálogo algum com os estudantes e professores, o MEC decide criar uma prova para entrar no Ensino Superior, única para todo o Brasil, diferente do vestibular. Todos os colégios se prepararam às pressas para ensinar aos alunos como passar nesse novo exame.
Porém, às vésperas do final de semana no qual se realizaria a avaliação, o ENEM é adiado, em vista de seu roubo e tentativa de divulgação.
Como? Como um Ministério pôde ter sido tão desorganizado, tão irresponsável, a ponto de não conseguir guardar uma prova?
Esperando declarações da UNE, os estudantes se decepcionam ao ouvir as palavras "Muito grave, é necessária profunda apuração do roubo", vinda de um representante da organização.
Por isso, está sendo criado uma nova organização, a NOVE (Nova Organização Voluntária Estudantil), a fim de retomar os protestos e reinvidicações em relação a absurdos como esse.
A NOVE, apartidária, realizou nessa segunda-feira, um protesto no Centro do Rio de Janeiro, denunciando o grave desrespeito cometido pelo governo com os estudantes e professores de todo o Brasil nesse ano.
Esse é o marco da retomada do poder da voz estudantil. É a volta da união e participação consolidade de um grupo do qual os antigos representantes se venderam.
Viva à NOVE!

sábado, 3 de outubro de 2009

Parte de algo mal escrito

Percebi, de súbito, a ausência dos meus óculos. Menos devido à visão ruim e mais por saber da falta do pertence tão necessário, sem as lentes sou assaltado por terríveis enxaquecas.
Procurei à volta, olhando superficialmente pelo escritório. Nada. Não poderia achar a certidão com a minha visão míope.
Senti logo as dores mentais. Encolhi-me dolorosamente, coloquei a mão sob a testa e sofri com a dilatação das luzes. Amaldiçoei a situação, irritando-me com meu estado. Enxaquecas já tinham se integrado à minha rotina, diariamente era assolado por aquele mau. Não havia muito tempo que começara. Infelizmente.
Bocejei pesadamente e gritei pelo nome de minha filha. A resposta, para minha surpresa, não veio imediatamente, mas após uma longa pausa de silêncio absoluto.
- O que é, pai? – gritou finalmente em resposta.
- Procura aí na sala meus óculos.
Silêncio novamente. Poucos instantes se passaram e logo ouço em um grito:
- Hm... Não.
Dei-me por satisfeito a princípio. Porém, uma dúvida veio à minha mente, o que me provocou divagações razoavelmente perturbadoras. Afinal, minha filha havia negado a presença dos óculos na sala ou o meu pedido de procurá-los? Considerei-me de imediato um tolo por pensar tal crueldade atribuída a um parente tão próximo.
A dúvida, todavia, não se apagou. Como revelado anteriormente, um dos meus maiores defeitos é a facilidade com que uma questão simples pode se fixar na minha mente e causar-me efeitos assustadoramente devastadores.
Tentei, então, raciocinar nos sentidos sintáticos da pergunta. Embora a enxaqueca continuasse a assolar-me com as dores, consegui, em um período de tempo relativamente curto, concluir a ausência de opção correta. A ambiguidade era facilmente notada no diálogo e a negação poderia se dar nas duas alternativas anteriormente citadas.
Amaldiçoei minha filha, com enorme pesar, por não ter sido mais específica. Mergulhei em pensamentos malditos que, misturados à enxaqueca, transformavam-se em uma orgia mental já conhecida, da qual geralmente não resultam boas coisas.
O leitor obviamente deve questionar a razão pela qual não perguntara a Carla a resposta de minha aflitiva dúvida. De fato, não havia motivo algum. Creio apenas que, devido a uma relativa falta de intimidade com meus filhos e a reflexão exclusiva pela qual passava, não me viera a mente tal solução.
Julguei, por fim, que Carla negara-se a procurar pelos óculos. Refletindo melhor atualmente, não posso me creditar tanta certeza, tendo em vista a ambiguidade conflitante da pergunta e resposta. Porém, estava certo, no momento, de que minha própria filha havia se entregado ao ócio e à indiferença, roubando-me a oportunidade de achar minhas lentes e restabelecer uma visão , muito provavelmente, foi o começo de uma série de discussões com meus três filhos. Não tenho por que acreditar que não sou mais amado pela prole, mas não posso negar o fato de que as visitas tem sido pouco frequentes. Tolo fui ao conflitar por motivos tão corriqueiros. Pago o preço agora e encontro-me em profunda solidão.
Poderia, entretanto, ter sido diferente? Caso estivesse certo, minha filha cometera um ato terrível. Com 50% de chances de estar correto, tive razões para odiá-la naqueles instantes. Como cria minha poderia cometer tal absurdo? Analisando agora, creio que fiz correto. Deve-se ser rígido com a punição, mesmo quando passa a infância e adolescência da prole. Caso meus filhos tenham se tornado pessoas vis a ponto de chegarem a tal extremo, não foi devido à educação que tiveram. Em relação a isso, minha consciência permanece tranquila.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Parte do conto "Estranho Amor"

Silencioso e imóvel era aquele amor. Estranho, mas forte.
O garoto esperava impacientemente pelo elevador. Olhou o relógio, que, quase malignamente, mostrou com seus ponteiros a hora: seis e quarenta e dois da manhã. Atrasado. Mais uma vez.
Por que tinha comprado um relógio analógico? Lembrou de alguns de seus amigos, que tinham um relógio digital. Mais prático, simples. Aquele, além de extremamente difícil de distinguir os ponteiros, fazia um barulho insuportável. Não do tipo que se ouve enquanto conversa, mas que, quando se espera por algo, mostra-se constante e insuportável.
Naquele momento, enquanto o garoto esperava pelo elevador, o ponteiro dos segundos movia-se com maldita precisão, acusando cruelmente o atraso. Um, dois, atrasado, um, dois, atrasado. Tinha que comprar um relógio digital, sim, compraria um. Não aguentava mais ouvir aquele barulho. Um, dois, chega!
Apertou mais uma vez o botão de chamada. Finalmente os números do painel começaram a subir. Alívio, embora parcial. Os segundos ainda passavam no ponteiro. Um, dois, atrasado, um dois, atrasado. Quase em conformidade, os andares pelos quais o elevador passava corriam. Um, dois, está chegando. Por que era obrigado a morar em um andar tão alto? Os pais, infelizmente, tinham paixão por alturas, refletindo inclusive no lugar onde viviam. Se não fosse assim, poderia pegar as escadas, mas, devido à verdadeira situação, o ato seria praticamente insano. Era imprescindível que, assim que morasse sozinho, escolhesse um prédio pequeno, para, em casos de emergência, pudesse descer rapidamente os degraus dos fundos. Três andares deveria ter o prédio, quatro no máximo, e apenas se o primeiro fosse o térreo. Caso contrário, procuraria outra moradia.
Agora não faltava muito. O elevador não era lento, pelo que o garoto era grato. O atraso ainda podia ser vencido. E, assim fosse, logo compraria um relógio digital, extinguiria aquele barulho. Um, dois, chega!
Porém, surpresa, os números do painel não pararam naquele andar, mas continuaram subindo. Alguém que morava acima tinha apertado também o botão de chamada. Maldito! Desrespeitoso era aquele ato, mesquinho e cruel. Por que tinha que chamar o elevador quando outro, no andar abaixo, esperava por ele tão ansiosamente? Ah, mas o sujeito pouco se importava com a situação do vizinho. Era um balofo, provavelmente, um balofo cuja vida tanto lhe frustrara que sentia a necessidade de piorar o atraso de terceiros. Só poderia ser assim, nunca diferente. E o ponteiro continua a se mover. Um, dois, atrasado, um, dois, atrasado. Balofo egocêntrico.
E o elevador começou a descer. Sabia que, quando a porta se abrisse, veria aquelas bochechas gordas alargadas pelo sorriso, cheio de malícia. Mas revidaria. Seu olhar seria tão penetrante que os olhos arrogantes do balofo seriam atingidos e, em poucos instantes, se esquivariam. A briga estaria vencida, e o garoto sairia triunfante. Tinha de preparar-se, em poucos segundos o elevador chegaria, junto com a contagem do ponteiro. Um, dois, que vença o melhor.
O número do painel parou no andar. Por um instante, o barulho dos segundos extinguiu-se, dando lugar ao apito de aviso, que evidenciava a interrupção do movimento do elevador. Logo, as portas se abririam, mostrando o sorriso malicioso do balofo. Era melhor ter o olhar já acusatório ou assim formá-lo ao ver a cara do vizinho? Tinha de pensar rápido, caso contrário perderia a briga. Acabou por escolher a primeira opção, devido aos intermináveis conselhos dos pais e professores sobre a importância de se preparar para tudo. O olhar já estaria formado com as portas abertas e, antes que o balofo pudesse fazer algo, seria atingido nos olhos, desviando, assim, a cara gorda, o que daria vitória ao garoto.
O olhar estava formado. As portas abriram lentamente, junto com o ponteiro dos segundos. Um, dois, surpresa! Não havia balofo, sorriso ou malícia no interior do elevador. O tempo foi suficiente apenas para desviar rapidamente os olhos, permitindo que o erro não completasse. A briga foi perdida em menos de um segundo do ponteiro. Mas não havia com quem brigar.
Havia apenas uma garota. Seus cabelos eram negros e levemente ondulados. A estatura era baixa, mas não diminuía seu corpo perfeitamente curvado. Seus olhos castanhos negros tentavam esconder a timidez, às vezes olhando para a parede, às vezes baixando as pálpebras.
O garoto esqueceu-se de tudo. Não mais havia atraso, barulho ou balofo. Seu olhar, antes acusador, agora estava apaixonado. Sua inquietação continuava, mas pelo motivo mais encantador que poderia imaginar.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Quem eu sou?

Essa é a pergunta que muitos fazem.
Mas a questão é: eu sou?
Você não é nada sem seus sentidos, mas eles podem estar totalmente errados, não são confiáveis.
Mas se não temos mais nada, temos que usá-los como referência.
A razão geralmente está certa, mas do que adianta a soma estar correta se os números são os errados?

Eu sou Daniel Vasconcellos Archer Duque, prazer.
Sou um estudante, preocupo-me com a questão ambiental, gosto de literatura, política, filosofia, economia e física moderna.
Vou usar esse blog para postar alguns textos meus. Eles são horríveis, mas gostaria que alguém pudesse confirmar isso.