terça-feira, 17 de novembro de 2009

Divagação...

Enquanto o ser humano se impôr no poder sobre todas as outras formas de vida do universo, estaremos aprisionados em nossa triste ilusão de soberania, escravizando a nós mesmos em um mundo virtual, isolado da realidade na qual estamos inseridos.

Não se preocupe, leitor, essa é apenas uma divagação...

Onze Minutos

Restam-me apenas onze minutos. “Para quê?”, pergunta o leitor. A paciência, porém, é aliada ao homem e aqueles que, por ignorância, renunciam a essa virtude devem, sem remorso algum, findar a leitura desse texto. Não me é bem vindo esse desventurado leitor, hoje viciado nas narrativas rápidas e constantes, que se deixa aprisionar pela literatura miserável, com a qual se consagram falsos escritores.

Finalizada essa questão, gostaria eu de retornar à afirmação inicial. Onze minutos, são os que faltam. Se não, menos, afinal, passam-se os segundos a cada segundo e, assim, escasseiam-se os minutos, extinguindo-se por fim e cedendo aos valores menores, porém cheios de gorduras temporais que, da mesma maneira, se queimam durante a corrida do tempo.

Onze minutos, pode contar, leitor? Sua leitura não passará dessa marca e, caso contrário, pode alegremente considerar-se um besta. Mas, provavelmente, aqueles que levariam mais tempo do que o por mim estabelecido já se afastaram desse texto. Se restar, porém, algum imbecil que desventuradamente continua a ler, possivelmente por teimosia, superficialmente esses períodos, aviso-lhe desde já que não se interessará por nada daqui. O leitor medíocre só encontrará nessas linhas o tédio e a monotonia, o que será de meu profundo agrado.

Onze minutos, e finalmente revelo ao leitor paciente (ou não) o objetivo dessa marca. Onze minutos para o fim. “Fim?”, questiona o leitor, e afirmo novamente: “O fim!”. Afinal, ao contrário do que se pensa, é de fins que se constitui a vida. Discorda? Pois muito bem, não esperava que o leitor pudesse superar suas mesquinhas limitações transcender à verdade. Por isso, provarei nos próximos parágrafos minha afirmação anterior.

Devo, porém, aqui fazer uma interjeição. Espero que se tenha percebido que no primeiro período desse parágrafo não adicionei formalidades inúteis e hipócritas, como “, caso me permita o leitor, ”. Não me atrevo a, pelo menos dessa forma, enganar aquele passa os olhos por essas letras. Esse é meu texto, escrito por mim. Eu imponho ao paciente leitor tudo que pode me vir à mente. Não é do meu feitio pedir permissão a algo que não obterei resposta. É uma redundância inversa, uma incongruência que tem se apresentado invariavelmente de toda a nova geração de falsos (ou até de verdadeiros) escritores. Esse parágrafo serve para explicitar ao leitor que tudo que aqui colocarei é-lhe imposto por mim e, assim que começar a entender o como é meu prisioneiro e se incomodar com o fato, aconselho-lhe que abandone o texto, pois só assim se verá livre do meu domínio.

Retorno, assim, a revelação dos fins. Não pedirei perdão ao leitor por ter-me dado por filósofo, impondo-lhe algo que provavelmente não é de seu agrado. Obviamente estou ciente da nova prostituição da filosofia, tendo se precedido sua rejeição, obrigando-a a esse novo cargo de concubina das ciências, adepta apenas por aqueles cujos cabelos já passaram dos joelhos. Começarei, finalmente, a explicação do que foi afirmado anteriormente.

A vida é feita de três fases, que se iniciam com começos e terminam com fins. Não ria o leitor que passa os olhos por essas afirmações, logo verá a lógica simples de minha ideia.

Temos como primeira fase, que se dá logo depois do nascimento, a infância, a juventude, na qual se começa um mundo inteiro novo, destacando-se o berço, os brinquedos e os estudos. Os fins começam cedo, com o fim da berço, logo em seguida, o fim dos brinquedos, e o mesmo se dá, finalmente, com os estudos, marcando o término da fase jovem.

Temos, portanto, a fase adulta, com o começo das responsabilidades, destacando-se o trabalho, o casamento e a família. Dessa vez, a fase dura muito, com o primeiro fim após apenas muitos anos. Primeiro se dá o fim do casamento, já estagnado e sem o amor dos primeiros tempos. Logo em seguida, vem o fim da família, com o provável divórcio, a morte dos pais e o crescimento dos filhos. O término da fase adulta, porém, se dá com o fim do trabalho.

É a vez agora da fase idosa. É difícil destacar os começos de anos que precedem o verdadeiro fim. Mas podemos talvez destacar aqui as leituras, as caminhadas e o sossego. Temos então, logo o fim das caminhadas, interrompidas pela fadiga. Em seguida, vem o fim das leituras, com a catarata, o cansaço dos olhos. O sossego finaliza quando o idoso já é afetado pelas dores pelo corpo, a enxaqueca, as ininterruptas tosses.

O último fim, como deve já saber o leitor, é o fim da vida.

É assim que termino a explicação de minha teoria. Contraponho com ela a hipócrita visão de mundo na qual a vida é feita de lutas e conquistas, absurdo incompreensível do pensamento humano. O leitor, provavelmente estupefato, deve agora entender porque se teme a velhice, porque se anseia a maturidade. Será a partir das vertentes do meu trabalho inicial que se darão outras diversas explicações para a realidade.

O leitor besta, acostumado à literatura medíocre, que eventualmente chegou até aqui, pode se considerar menos imbecil. É seu dever agora entrar na verdadeira leitura, proporcionados pelos verdadeiros escritores. Caso não o faça, espero que pelo menos esteja ciente de sua incongruente estupidez. Antes compreender a próprio mediocridade do que viver ignorando seu male maior.

Onze minutos. O leitor chegou até aqui para entender essa marca temporal. Onze minutos para o fim. Para o fim do texto. Para o fim da teoria. Para o fim da vida. Minha vida.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Cap. 1: Sonho

- Matamos o tempo, o tempo nos enterra – Memórias Póstumas de Brás Cubas, Machado de Assis.

Sonhava estranhamente. É bem verdade que nunca tivera sonhos exatamente normais, porém aquele, logo aquele...

No começo havia apenas o nada. Se for necessária uma alusão, é bom que se pense no gênesis, antes de Deus, por algum enorme equívoco, dar início à criação. Em seguida, vejo a luz vermelha preenchendo todo o espaço. Palpitando irregularmente, a cor ofusca-me com sua vibração inerente. De repente, o escarlate absorve a realidade. Não só o vejo, mas o cheiro, ouço, toco, sinto. A sinestesia me atordoa e tento agachar-me e apoiar-me no chão. Percebo, então, que não há chão, braços ou pernas. Havia só o escarlate. Eu era o escarlate.

Encolho-me, de súbito, concentrando-me inteiro em um único ponto. À minha volta, nascem grandes colunas, semelhantes a obeliscos. Acho, então, estar girando, pois minha visão se move circularmente. Mas o erro é logo notado. Tudo roda, tudo gira, apenas eu permaneço parado.

E essa inércia acelerada permanece, com o constante movimento das colunas, que começam a apresentar fragilidade. Na minha eterna imobilidade, vejo, repetidamente, tudo desabar sobre mim. A situação, obviamente, é acompanhada pela quinta sinfonia de Beethoven.

Cap. 2: Acordando

O sonho, então, se interrompeu. Acordei naquela manhã, sob a pálida luz do nascer do Sol, esfregando longamente os olhos. Esquecera novamente a janela aberta. Muito esperei deitado até perceber que o sono não retornaria. Sentei-me sobre a cama, de cabeça baixa, tentando lembrar de tudo que passara. Sim, claro. Era meu aniversário.

Lembrei-me aos poucos da data da qual tentava fugir, desesperado. No dia três de Setembro de 2007, completava exatamente cinquenta e cinco anos e via no espelho do quarto todos os meus fios de cabelo grisalhos. A primeira vista, tal fato não agrega tamanha importância, mas, durante toda minha vida, meu cabelo, de exuberantes mechas onduladas e escuras, foi o maior expoente de minha escassa beleza. Não foi sem motivos que sempre o conservei volumoso, embora não longo, o que eu realmente desprezo em um homem.

Retornando ao fato, estava eu a observar-me de frente ao espelho, procurando qualquer fio negro que fosse, sem êxito algum. Tal foi minha energia em achá-lo, que, do meu despertar até o momento em que percebi que só acharia o cinza naquelas mechas, tinham-se passado cerca de quarenta minutos, o que um infeliz leitor há de concordar que não é pouco.

Suspirei longamente, decepcionado com a falha da busca, imaginando se não seria tempo de artificializar-me. Porém, logo após poucos instantes, descartei a hipótese, não compreendendo como poderia tê-la nela pensado. Caminhei pesadamente até a janela e apoiei-me ao parapeito. Por alguns instantes fiquei a observar a extensa Praia de Copacabana, admirando-a e culpando-a pelas minhas olheiras. Abaixei a cabeça, olhando para o nada.

Vislumbrei, de súbito, algumas pessoas caminhando pela calçada da praia. Pequenas pessoinhas a andar pelo asfalto, em um horário extremamente inconveniente (acredito que não passavam das seis e meia da manhã). Tamanha incongruência atordoava-me, e acabei por devanear o que motivava aqueles seres a agirem de tal maneira, tão bizarra, tão... disposta. Eram poucas, é bem verdade, mas o suficiente para vê-las como um grupo desorganizado de formigas, vagando sem rumo para esquerda e direita, a fim de encontrar algum caminho. Creio que aquela situação enquadrava-se melhor a mim, mas a relação não foi entendida no momento em que ocorreu. Estava demasiadamente entretido nas formiguinhas para pensar em assuntos tão complexos.

Cap. 3: Erro

Peço desculpas a algum leitor que, por imensa desventura, iniciara a leitura deste texto. De fato, creio tê-lo começado errado. Por um inexplicável motivo, contrariei princípios básicos meus tendo escrito as linhas precedentes a esse parágrafo. Explicarei a seguir ao leitor. Espero que, uma vez que já se lera até aqui, possa-se pelo menos entender meu erro nas próximas linhas e abandonar satisfatoriamente o texto.

Acredito que, no início de qualquer escrita, deve-se sempre explicar o motivo da mesma, justamente o que não realizei e pelo que suplico perdão. Em realidade, se me fosse possível, pegaria outra folha de papel e recomeçaria novamente. Infelizmente, essa possibilidade não me é concedida.

Vejo também que adicionei certos aspectos estranhos ao texto. Não gosto de poetizar, sou averso a lirismos, mas quando o leitor lê “sob a pálida luz do nascer do Sol” não duvida da intensão do autor de frutificar sua estória, dar-lhe aromas e cores, algo do qual tento me afastar. Jurei a mim mesmo que escreveria de forma crua, sem floreios. A falha, no entanto, dá-se logo nos primeiros períodos, em um importante entre vírgulas do meu texto. Analiso facilmente a ridicularização do ato.

A origem do erro, porém, devo afirmar que é legítima. Há tempos tenho essa imagem na minha cabeça, atormentando-me constantemente durante meu refúgio. Lembro-me visivelmente daquela luz ofuscante, como se transparente, incomodando meus olhos. Uma das mais belas vistas do mundo e um dos piores modos de acordar unidos em uma única situação. A praia de Copacabana é linda, de fato, mas não muito conveniente quando lhe foge a mente a necessidade de fechar a cortina antes de dormir.

O eventual leitor que, por algum infortúnio, continuou a leitura provavelmente se pergunta nesse momento se o motivo da escrita é, realmente, a imagem do nascer do dia no meu aniversário repetindo-se na minha mente, retornando quase que como em um curto círculo. Não, pelo menos não de todo. É fato que essa maldita manhã impulsionou-me a apressar-me a escrever o relato, porém já tinha essa ideia na cabeça há tempos.

São vários os motivos pelos quais resolvi contar minha estória. Um deles, o mais sério, é avisar à sociedade de um mau livre, rondando escondidamente pelas ruas do Rio de Janeiro. É preciso, sim, que o desventurado leitor saiba de minhas vergonhas passadas para que entenda a crítica situação à qual cheguei e a injustiça a qual sofri, justamente a inversa que se deu sobre o mau que continua a vagar pelos bueiros da população carioca.

O segundo motivo, o qual também devo dizer, é restabelecer a confiança em minhas memórias, que vêm decepcionando-me ao se enrolarem em várias voltas e amarras. Creio que, pela necessidade de organiza-las para escrever partes da minha vida, acabo colocando-as em ordem, podendo novamente adentrá-las sem medo de me perder em devaneios absurdos, o que vem ocorrido com frequência.

O resto, caso o infortunado leitor deseje continuar a leitura (e aqui se encontra um inevitável pleonasmo), será revelado.

Cap. 4: Medíocre

Sou um homem medíocre, e não vejo por que não fazer tal afirmação. Minha vida, estagnada e previsível, finaliza-se com um desfecho quase que idiota (peço desculpas pela insubstituível expressão). Devido ao meu excesso de confiança, no fim, tive-me só, podendo contar apenas comigo mesmo. Minha morte, obviamente, não se deu fisicamente, mas creio que minha mente já está, há muito, enterrada, cremada, polvorizada.

A mediocridade, e é certa a próxima afirmação, não é a origem de todos os males. Como dito anteriormente, sofri de uma enorme injustiça, a qual só poderá ser revelada no fim. Caso o leitor não possua a paciência necessária para ler tamanho monotonismo, deve-se avançar até o fim do relato, no qual revela-se um desfecho menos sufocante do que o resto do texto. Todavia, aquele que prefere sujeitar-se à minha imbecil estória, poderá compreender (à custa de uma enorme avalanche de tédio) melhor como se deu meu atual quadro.

A cultura anticultura

Muito se fala da educação brasileira, nada exatamente bom. Porém, embora seja esse um assunto já popular, existe, há algum tempo, certo equívoco da sociedade em relação às responsabilidades do fracasso que é o nosso ensino.

O Brasil nunca teve como um forte a educação. Possivelmente, a história tem muito a nos responder o por quê. Com um passado de colônia de exploração, monarquia agrária e república conturbada, explica-se boa parte de nossa cultura quase como se “contra” as escolas. Já isso em muito influencia na democratização do “jeitinho brasileiro”, ao qual tantas vezes nos recorremos para resolver problemas do cotidiano.

Refiro-me, obviamente, não apenas ao ensino público, mas também ao privado, embora esse último seja razoavelmente melhor. O Estado é, afinal, governado por pessoas, que, apesar de todos os mitos, fazem parte da mesma cultura que nós, brasileiros. Se o governo não dá muita atenção a esse setor, também não o faz a sociedade no geral, pois ambos, incluídos no sistema capitalista, pensam nos custos, que são muitos, e nos lucros a curto prazo, que são poucos. Por isso vêem-se diariamente estudantes de classe média e alta, todos em colégios medianos ou até acima da média, que não dão importância às suas notas (o que se deve à falta de cobrança da família), começando a se preocupar apenas quando estão quase repetindo de ano, já na chamada “recuperação”. Esse quadro também é visto nas escolas públicas, embora de modo mais gritante.

Essa cultura anticultura (visto que a mesma é produzida apenas com instrução e aprendizado) reflete-se em diversos problemas que travam o desenvolvimento do país. Uma delas, a mais direta, é a falta de mão de obra qualificada, o que desestimula investimentos estrangeiros no setor da alta tecnologia e freia a própria produção científica brasileira. A segunda, mais genérica, embora ainda mais importante, é a falta de planejamento no crescimento da nação. O Brasil não age, mas reage. Isso se repete em toda história, como se visitássemos “um museu de grandes novidades”, parodiando Cazuza. O mais fundamental exemplo é a industrialização do país, que se deu em maior escala apenas quando o café deixara de ser tão rentável depois da crise de 29 e as importações tinham diminuído devido à Segunda Guerra Mundial.

Há algum tempo, isso vêm mudando. Há muitas críticas a se fazer referentes ao Governo Lula, mas deve-se entender que a educação correspondente ao seu poder (que estende-se diretamente apenas às universidades e escolas federais) melhorou até certo ponto. O número de profissionais com títulos de doutor e mestre, jamais foi tão elevado. Pela primeira vez na história, o Brasil atingiu a meta de formar dez mil doutores e 40 mil mestres por ano. Em 2006, 10.868 bolsistas de doutorado e 15.646 de mestrado contaram com o apoio da Capes, o que representa um aumento de 33% e de 32%, respectivamente, sobre os números de 2001.

Será, portanto, que a educação está de fato melhorando? Sim, mas parcialmente, afinal, o ensino médio e fundamental são até hoje péssimas, com raras exceções. Isso, porém, não é atribuição do governo Federal, mas do Estadual e Municipal. E são essas esferas do poder que dão maior descaso ao ensino, devido, também, à corrupção e falta de orçamento, mas principalmente à cultura anticultura.

A sociedade não vê como “produtiva” a educação básica, imaginando, equivocadamente, que não será ela que mais influenciará na luta pelo emprego. É nesse ponto que a população mais se engana. Sem saber bem ler, escrever, contar, somar, subtrair, como esperar um bom ensino médio, uma boa faculdade? Conversando com um professor de física do ensino médio, que também trabalha em uma escola estadual, soube de um caso em que, questionando a velocidade média de um carro, em movimento uniforme, que se desloca 100 quilômetros em uma hora (desprezando, é claro, forças como o atrito e resistência do ar), ouviu apenas o silêncio. Não é preciso cursar faculdade de física ou matemática para responder essa questão.

É necessária, portanto, a maior preocupação dos brasileiros em relação ao ensino médio e fundamental. Exigir dos governos Municipais e Estaduais uma boa educação é muito mais fácil do que fazê-lo do Federal. Desculpas, porém, serão sempre presentes. A falta de tempo e ocupação excessiva da população é, aparentemente, um sério problema nacional.