Nunca consegui compreender exatamente o
que seria essa ideia de razão. Foi-me sempre apresentada como um conceito
objetivo e - surpreendentemente - externo ao homem, como se a natureza já se
utilizasse dela muito antes de nossa percepção, o que sempre me pareceu, em
algum grau, uma loucura. Conforme fui me acostumando com ideia, pude perceber
algumas incongruências quase dogmáticas nessa abstração que, supostamente,
libertaria o homem da selvageria e o iluminaria em direção ao... Ao quê? Alguns
dizem que é ao desenvolvimento. Do quê? Da racionalidade, talvez. Olha só,
entramos em um argumento circular.
A verdade é que, através do mito da razão,
criaram-se diversos paradigmas e ilusões de superioridade que estão já há muito
arraigados na sociedade. A arte - sempre ela - é a principal vítima dessa
ideia. Com o artifício da razão, a arte é criticada, lapidada e até
descreditada por aqueles cuja lógica racional é a única possível. Subjugando a
subjetividade humana, cria-se a (suposta) possibilidade de racionalmente julgar
e medir a qualidade artística de uma obra, como se o sentimento passado fosse
mero detalhe.
Ora, como se a própria utilização da razão
não fosse fruto de um sentimento! Apesar de muitos crerem religiosamente que
são racionais por ser esse o modus
operandi natural-ideal do ser
humano, é impossível negar que é por um sentimento de satisfação pessoal e
(sim!) subjetivo que utilizamos esse artifício cheio de regras próprias e
formuladas pelo próprio homem.
Acabou que nossas próprias relações
pessoais hoje são totalmente permeadas por essa ideia abstrata, cuja regra é a
geração de um conflito, por entender a verdade como única e racionalmente
alcançável. Quão mais se utiliza a razão, mais impossibilitados se tornam os
consensos. É impossível negar avanços, como a supressão das coerções pessoais
(no nível ideal), mas é pela desvalorização da subjetividade humana natural que
cavamos nossas próprias tumbas ao suicídio artístico-pessoal, criando uma massa
fadada à pior das previsibilidades: a cultural.
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