terça-feira, 29 de abril de 2014

Meu medo

Quando criança, comecei a desenvolver narrativas futuras à minha vida. Começando a ler livros de ficção, entre os oito, nove anos, não consegui me imaginar trabalhando com qualquer outra coisa que não fosse a literatura (infanto juvenil até então). Mas não me bastava dizer: 'Serei escritor', era necessário criar histórias, datas e marcos na minha vida profissional (sempre interagindo com uma desvalorizada vida pessoal). Eram verdadeiras histórias que criava na minha mente, de certa forma semelhantes àquelas às quais submetia meus brinquedos.  

Meu sonho de ser escritor durou até os 13, 14 anos, tendo rendido três (péssimos) livros de ficção incompletos. Um chegou a ter 190 páginas de folha A4, enquanto outro tinha 90, e o último, 40. Recentemente reli esses livros com muito gosto, rindo de como pude algum dia escrever tamanhas barbaridades. Lembro de como esse sonho foi cada vez mais dando lugar a outro: o de ser músico.

A música sempre me foi sedutora, mas o sonho, a projeção, tal qual me fora a ideia da literatura, já me foi bem mais incerto. Havia certamente a questão da aptidão: enquanto muitos elogiavam - não sei como - meus livros e histórias, como músico demorei muito a receber qualquer elogio que fosse. O ritmo foi-me o primeiro desafio, me levando a passar horas tentando separar compassos. Nunca me foi natural o aprisionamento do som em uma batida contínua, tinha até então ouvido música de forma extremamente errática. Talvez só com 15 anos tenha começado a dominar meu passo, de modo que pude me disciplinar a trocar de notas no tempo certo. Até ali, no entanto, já tinha criado todos meus álbuns, datas de lançamento, críticas e entrevistas da vida de músico projetada na minha mente.

Foi a partir dessa idade, no entanto, que começaram outros dois interesses: política e economia. E assim passei a me imaginar também político e economista. Para piorar, aos 16 anos redescobri a literatura, através da biblioteca pessoal do pai de minha primeira namorada. Começando por Goethe, seguindo por Camus, até pousar finalmente em Graciliano Ramos, o sonho de ser escritor retornou como um foguete que volta estrondoso à Terra. Foi nessa época que criei esse blog.

O novo sonho de escritor durou até meus 18 anos e rendeu, dessa vez, bons contos. O desejo de ser músico voltava então, finalmente rendendo críticas positivas às minhas composições. Até os 20 anos meu estudo e produção foram intensos, mas desde então dando lugar a outros sonhos.

Hoje me vejo aqui, fazendo estágio no Instituto Brasileiro de Economia, estudando Ciências Econômicas na UFRJ, cursando o programa de Fundamentação da Escola de Artes Visuais, escrevendo sobre música na Revista Agito Rio. Parece-me às vezes que perdi um pouco o rumo e misturo os sonhos. Minhas projeções narrativas continuam, mas agora diversificadas, abarcando múltiplas possibilidades. Diante disso, percebo meu receio de ser monocromático. Não quero me ver no futuro limitado a um caminho por ter sido obrigado a escolher. Meu sonho de fato é transitar por todos os versos da vida, descobrir e desenvolver quantas aptidões forem possíveis.

Talvez meu medo seja tornar o futuro previsível.

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